terça-feira, 21 de setembro de 2021

Cabeça de Rainha

"Meu amor, acho que te contemplei pouco, olhei pouco para ti, escutei-te pouco, compreendi-te pouco, quis muito. Fui injusta contigo e comigo. Enevoada por esta urgência e necessidade imposta por um mundo tão injusto para as mães, que lhes diz que devem ser tudo aquilo que conseguirem: mães, mulheres, esposas, empreendedoras, donas de casa. 

Achei que seria capaz de tudo, e fui, porém, nem tudo foi prazeroso. Tive, em muitas destas coisas, um escape para aquilo que não conseguia controlar: estar contigo quando choravas constantemente, estar contigo quando não dormias, estar contigo quando te amamentava, dava banho, mudava fraldas, e só queria 5 minutos para mim ou uma noite inteira de sono. Não consegui, então fugi de ti, quando tudo o que mais queria era mimar-te."

Ultimamente, tenho pensado um pouco mais a sério na possibilidade de ter um segundo filho. Segundo filho, terceira gravidez. A mágoa de uma conceção que não chegou ao fim ditou que, pelo menos durante um ano, não pensasse no assunto. Não estava traumatizada, mas não conseguia deixar de matutar que a primeira gravidez tinha corrido bem, o parto tinha corrido bem, então por que raio tinha eu abortado espontaneamente às quatro semanas? Bem sei que é normal e todas aquelas cosias que nos dizem: “o nosso corpo é muito inteligente e percebe que algo não está bem e expulsa”. Não sei quanto às outras mulheres que passaram por tal violência, mas a mim, esta explicação não me acalmou nem um bocadinho, pelo contrário.

De maneiras que uma gravidez interrompida aliada a quase dois anos de privação de sono, levaram-me a esquecer o tema. Ficou ali no canto das memórias ou dos projetos que não se concretizam.

Nunca, sequer, pensei que iria equacionar a hipótese de não ter um segundo filho, aliás, a ideia seriam três, todavia só quem passa por estas duas situações consegue compreender a dimensão que elas podem atingir.

“Não há dois bebés iguais” — dizem-me os fervorosos que anseiam pela chegada de mais um, e isto soa a absolutamente nada para quem esteve quase três anos sem dormir. 

Eu não tenho medo do parto, de acordar de 3 em 3 horas, de amamentar, de mudar fraldas cagadas às 5 da manhã ou acalmar cólicas. Não tenho medo de ser mãe outra vez, de criar outro ser humano e tentar fazer dele a melhor pessoa possível, não tenho medo de que ele seja igual à irmã. Tenho medo de não aguentar. Tenho medo de passar-me para o outro lado e não conseguir sair de lá. E este medo é tão palpável que, ainda não existindo, já é real.

Quando a Maria Clara passava por esta fase, perante aqueles que me liam, fiz muitas piadolas sobre o assunto e, por isso mesmo, aparentemente estava tudo bem. Não estava! Chorei muitas vezes porque achava que não aguentava mais. Gritei demasiadas vezes com uma bebé que não tem culpa que a mãe esteja estoirada. Senti-me muitas vezes uma merda de mãe. Fugi muitas vezes desse sentimento. Não se trata de ter tempo para nós, de ir beber um café com uma amiga, de sair à noite lá quando calha para namorar ou tirar férias a dois para retomar a vida de casal. Trata-se de fugir. De fugir de uma dor e de um cansaço que cresce todos os dias e que não conseguimos controlar. Trata-se de querer parar uns minutos e a nossa vida seguir a 180km/segundo. Trata-se de querer ser a mãe perfeita para perceber, da pior forma possível, que ela não existe.

Não sei se a Maria Clara terá irmãos, não sei se conseguirei tomar essa decisão sem que a espinha se arrepie, só sei que ser mãe é, e será sempre, a tarefa mais difícil do mundo, e no entanto, é, também, o único trabalho que é pago em amor. E amor queremos sempre receber.

Baixem os braços. 

Não tenham medo. 

Não tenham vergonha. 

Não se pressionem.

O mundo continuará a girar. 

Parir um ser humano e cuidar dele já é coroa que pese o suficiente nessas cabeças de rainha.






Só as mães sabem

Amar-te. É sentir saudades tuas todos os segundos, mesmo que estejas a meu lado. É ser irracional e querer cuidar-te sempre. Para sempre. Co...