terça-feira, 25 de julho de 2017

Estado de graça!

Sabem aquelas pessoas que parecem um burro a dar um coice quando, no seu íntimo, acham que estão a ser o mais amável possível? Prazer, eu! 
Tendo em conta esta predisposição natural para o mau feitio, qual o meu espanto quando agora, de repente, do nada, ou melhor, 4 meses e uma pança proeminente depois, percebo que toda a população não estava contra mim, afinal, só ainda não estava grávida!

Chego à farmácia ( que normalmente tem 30 pessoas à minha frente) e tiro a senha prioritária! Ainda hesitei, mas tendo em conta que nunca estive grávida e o peso que tenho agora nunca na vida tinha tido, o raio dos pés já incham, a coluna já doí e as pernas já pesam, decidi! Exerço o direito que tenho e saco da dita senha!
Não demorei 5 minutos a ser chamada, dirijo-me ao balcão e começo a ouvir um senhor nos seus 60 anos a dizer para outro: 
- N'ouves (sim pessoal, estamos no Algarve e algumas pessoas falam assim), que númere é que tens?
- É cá tinha o 370, mas parece que agora chamaram o 375, na tou a perceber nada diste! Tã e tu?
- É tenhe o 372...

E eles lá continuaram nisto, muito indignados, enquanto olhavam para as senhas e para mim, para mim e para as senhas, com uma clara e evidente vontade de me esganar!!
Achei por bem intervir, até porque não queria deixar ninguém pensar que me tinha infiltrado na fila assim à maluca.

- Olhe desculpe - começo eu - eu tirei a senha prioritária, porque estou grávida. Peço desculpa!

Ahhhhh a palavra mágica, eis que uma auréola surge por cima da minha cabeça, uma luz linda e brilhante circunda-me e o estado de graça entra agora na minha vida! Já me tinham explicado todo o mimo e atenção que iria ter, mas isto meus senhores, não estava à espera!

- Oh menina, é qu'peçe desculpa! 'teja à vontade! Na se preocupe...agente espera que tem tempe! 
Seguido de um sorriso rasgado de canto a canto.


O segundo estado de graça aconteceu no estacionamento. Andava eu à procura de lugar, quando vi que um carro estacionado ia sair; marcha atrás com ela, pisca para a direita e travão de mão puxado!

"Mas que raio, nunca mais saem dali?? Se calhar estão a estacionar...bom, mais 5 minutos, senão vou-me embora" (yep, paciência também não é o meu forte).
BIIIPPPPPPPPPPP - começa o meu vizinho de trás, faço-lhe um sinal com a mão! Não! não foi esse! Foi o outro de pedido de tempo, como fazem no desporto. "Aguenta aí os cavalos amigo, estou mesmo quase" - pensava e esperava eu!
Nada! O carro continuava estacionado, as pessoas lá dentro, nenhum sinal de marcha-atrás e uma fila de carros estava a formar-se atrás de mim!
"Bom, talvez seja melhor ir lá perguntar se vão mesmo sair" - penso eu.

Saio do carro e olho para o dito senhor que estava parado atrás de mim, e tento pedir-lhe desculpa com o típico aceno de mão - "Olhe desculpe lá, pensava que isto demorava menos tempo..."
E eis que, na posição lateral, ele consegue visualizar a minha pancinha de grávida e imediatamente me abana a cabeça afirmativamente, estica a mão e dá-me sinal para prosseguir - "Ahhhhh a auréola novamente!!!" - penso eu, emocionada!
Caminho na direção do carro estacionado e bato levemente no vidro, e foi aqui, precisamente neste momento, que percebi que a gravidez se trata MESMO de um estado de graça e que faz bem, muito bem às pessoas, ficam mais simpáticas, mais queridas, mais bem dispostas. As grávidas também ficam, mas especialmente aqueles que se cruzam connosco!

A senhora olha para mim por cima dos óculos de sol, com ar de poucos amigos, enquanto ainda estou dobrada ao lado dela, desce o vidro e da-lhe um género de espasmo seguido de AVC como quem diz: "o que é que queres?"
Ponho-me em posição recta ao mesmo tempo que lhe pergunto se vai sair.
Pois é...a barriguinha novamente...! Aparece-lhe, vindo não sei bem de onde, um sorriso que mostrava o bom dentista que a senhora frequentava em conjunto com um "claro que sim, vou sair já, já!"
Agradeci, sorri e retirei-me para o meu carro, onde a fila atrás de mim já tinha uns bons 6 carrinhos em espera...tranquilo!

Num mundo em que é tão raro presenciarmos actos de compreensão, humildade e carinho para com o próximo, este nosso estado de graça conseguir transformar este mesmo mundo num sitio bem melhor para os nossos rebentos crescerem, parece-me justificação suficiente para as auréolas e a luz própria que ganhamos enquanto aguardamos o nosso maior tesouro!


















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